Madeleines – um dos maiores símbolos da França. Originária da região de Lorraine (do mesmo santo lugar de onde veio a quiche lorraine) esse bolinho traz “joie de vivre” pra gente – a alegria de viver. Alguns dizem que ela surgiu na cozinha do duque de Lorraine, Stanislas Leszcynski (que era, além de sogro de Louis XV, rei da Polônia que perdeu seu reino e então ficou exilado na França). Diz a história que o duque um dia receberia para o jantar o polêmico escritor Voltaire, que era odiado por todos naquela cidade, tanto que o mordomo e padeiro do duque se recusaram à servi-lo. Então a cozinheira da casa, Madeleine, para salvar o jantar fez uma receita de bolo que aprendeu com sua avó – que ficou tão boa que ganhou a apreciação do duque, de seus convidados e depois se espalhou pela cidade, em seguida por toda a França, levando o nome da cozinheira. As madeleines também foram imortalizadas na obra “Em busca do tempo perdido” do escritor Marcel Proust, que usa as madeleines para explicar suas ideias sobre memórias afetivas evocadas através do gosto de algo (no caso do exemplo que ele conta na obra, através do gosto de uma madeleine).
Não é a toa que as madeleines ganharam tanta fama e ainda foram escolhidas por Proust para ilustrar suas ideias sobre tempo e memórias. Recém-assadas elas nos proporcionam uma experiência marcante, de memória eterna. Ao sair do forno possuem um breve momento de glória, apresentando bordas sutilmente crocantes, um centro macio e ao ser mordida libera um vapor cheio de aroma, que é um sopro de vida, absolutamente emocionante. Mas isso só acontece nos seus primeiros 5 minutos, depois já mudam de textura. Ficam boas depois também, mas essa glória dos primeiros 5 minutos é algo mágico, prove ao menos uma vez na vida. Já disse Dominique Ansel: “Pisque e você vai perder o melhor da madeleine”. Elas sensivelmente nos mostram uma lição sobre o tempo e sua sutileza – sobre o sopro da glória que é rápida mas que deixa uma marca eterna. É complexo de explicar, melhor sentir. Vamos a receita.
Ingredientes (para aproximadamente 22 madeleines):
- 3 ovos
- 130g de açúcar
- 200g de farinha de trigo
- 10g de fermento em pó
- rapas de 1 limão-siciliano ou laranja
- 180g de manteiga
- 20g de mel
- 60 ml de leite
Modo de preparo:
Você precisará da manteiga derretida, mas ao invés de só derreter, eu faço uma coisinha que aprendi com a Raíza Costa: se você “queimar” um pouquinho a manteiga ela cria um sabor bem mais intenso, que beira o sabor de nozes, e deixa sua receita muito mais encorpada com um tom incrível! Para isso, basta fazer o seguinte: Coloque a manteiga em uma panela em fogo brando, quando derreter você verá os sólidos do leite subindo e se separando da gordura (formando uma espuma na superfície), depois de alguns segundos esses sólidos (a espuma) vão afundar e tostarão no fundo da panela, deixando a mistura num tom castanho escuro – quando atingir essa cor desligue a panela – pronto, essa reação deixará a manteiga com um sabor singular incrível! Quando desligar o fogo, misture nela o mel e o leite. Reserve.
Bata os ovos com o açúcar até ficar mais esbranquiçado e espumoso. Adicione a farinha e o fermento e misture tudo. Em seguida acrescente a mistura de manteiga derretida e as raspas de limão, misture tudo até ficar homogêneo. Cubra e deixe na geladeira por algumas horas ou por uma noite – esse descanso é muito importante para você ter a experiência emocionante ao morder sua madeleine.
Após o tempo de descanso da massa, hora de assar. Pré-aqueça seu forno à 200 graus. Unte com manteiga e farinha as forminhas de madeleine se tiver, se não tiver unte as que tiver. Coloque a massa nas formas (não encha as formas até o final, coloque massa um pouco acima da metade do espaço). Leve para o forno pré-aquecido e asse à 200 graus por 5 minutos, então abaixe o forno para 180 graus e deixe mais cerca de 10 minutos – até ficar dourado nas bordas.
Enquanto assa, deixe seu chá ou o que for acompanhar prontos, na mesa, esperando – porque quando as madeleines sairem do forno você precisa comer pelo menos uma delas no momento de glória – que são os seus primeiros 5 minutos. Morda, sinta, respire essa vida incrível que ela exala nesse momento. Enfim, espero que ao morder entenda a emoção que escrevo aqui.
Dicas: Antes de assar as madeleines, você pode espetar uma framboesa fresca em cada uma delas, fica muito gostoso. Também pode fazer cremes doces de seu agrado para acompanhar. Seja criativo e faça algo que tenha sentido para você para complementar, você é livre para criar e a cozinha te lembra disso.
Bon appétit!